Reportagem do Fantástico sobre dor lombar gera debate entre fisioterapeutas
No último domingo (10), o programa Fantástico, da Rede Globo, veiculou uma reportagem da série “Essa dor que não passa”, apresentada pelo médico Dr. Drauzio Varella, a respeito da dor lombar e as principais causas do problema. De acordo com o programa, a dor lombar é uma das principais causas de afastamentos no trabalho, 70% das dores na coluna são na região lombar e 80% da população irá desenvolver dores nesta região em algum período da vida. Diversos fatores influenciam e predispõem a dor lombar, tais como deficiência de vitamina D, tabagismo, predisposição genética e obesidade central.
Conforme explica o fisioterapeuta Dr. Rodrigo Andrade, mestre em Ciências da Reabilitação, a dor lombar é considerada uma epidemia e uma das doenças mais incapacitantes do mundo. Porém, a dor não pode ser considerada um problema apenas de ordem física, já que existem diversos fatores sociais, psicológicos, de crenças e culturais que modulam a dor, segundo versa o modelo biopsicossocial. A fisioterapeuta e quiropraxista Dra. Ines Naskashima complementa que “os tratamentos atuais recomendados, baseiam-se em remover as fontes nociceptivas, seja através da Quiropraxia, Osteopatia, liberação miofascial, Mackenzie, laser, ultrassom, e outros, com o objetivo de evitar a sensitização no sistema nervoso central”.
Nos casos apresentados na reportagem, os pacientes entrevistados recorreram, constantemente, à medicalização para tratamento da dor. No entanto, um tratamento à base de medicamentos, além de ser custoso, não irá tratar a causa do problema, somente a dor ou a inflamação. “Dados estatísticos informam que o uso de anti-inflamatório mata tanto quanto a Aids. Além disso, não atuam na causa do problema. Na grande maioria dos casos de dor lombar, a fonte é uma falha mecânica e o repouso leva a atrofia muscular: 1 a 1,5% de perda de massa muscular por dia, descondicionamento cardiopulmonar (15% de perda da capacidade aeróbica em 10 dias), desmineralização óssea, risco de tromboembolismo, dentre outros efeitos adversos”, explica Dra. Ines Nakashima. Já Dr. Rodrigo Andrade ressalta que as constantes realizações de exames complementares, em busca de um diagnóstico, podem agravar o estado de saúde do paciente, resultando no chamado efeito nocebo, definido como uma sugestão negativa capaz de induzir os sintomas de uma doença. “Exames de imagens não confirmam diagnóstico. A conversa com o paciente, os exames clínicos e testes são suficientes”. Dr. Rodrigo acrescenta que o paciente pode vir a desenvolver depressão, ansiedade, distúrbios de sono e outros problemas.
Segundo Dr. Eduardo Filoni, Conselheiro do Crefito-3, existem estudos que demonstram que a catastrofização dificulta o processo de remissão dos sintomas e, na reportagem, isso foi evidenciado. “As imagens da reportagem mostram condições clínicas também de cinesiofobia, medo de realizar o movimento, que precisam ser consideradas clinicamente e, de uma certa forma, trabalhadas pelos profissionais da saúde. O fisioterapeuta tem uma abordagem direta que deve considerar sempre a avaliação físico-funcional e a prescrição de condutas baseadas em objetivos a curto, médio e longo prazo”, diz.
Ao paciente com dor lombar, Dr. Rodrigo recomenda, com base nas diretrizes internacionais da NICE (National Institute of Health and Care Excellence), o encorajamento para prosseguir com as atividades cotidianas; promover o retorno ao trabalho; considerar um programa de exercícios com base na preferência do paciente; Terapia Manual associada somente ao exercício; estratégias cognitivas associadas a exercícios ou Terapia Manual; anti-inflamatórios não-esteroides com a menor dose eficaz e opióides fracos para controlar a dor lombar aguda se anti-inflamatórios não-esteroides forem contraindicados ou ineficazes. Dra. Ines afirma que “a educação do paciente, utilizada não somente no tratamento da dor lombar, tem sido reconhecida internacionalmente como um recurso altamente recomendado para o manejo da dor onde, da mesma forma que todo o cérebro é refeito em algumas semanas, novas assinaturas neurais podem se formar e, com isso, erradicar a dor”.
Excesso na indicação de cirurgias
O Hospital Albert Einstein desenvolveu um programa em que reavaliou indicações de cirurgias da coluna. Segundo dados, em dois anos, dos 1.679 pacientes que chegaram com pedido médico para operação, apenas 41% foram confirmados como realmente necessários. A grande questão do excesso de indicação de cirurgias de coluna é que, além de ser altamente oneroso, pois os procedimentos chegam até 200 mil reais, quando mal indicada, as operações podem ocasionar em perda de mobilidade e outras sequelas.
No caso de cirurgia de fusão em Dor Lombar Crônica (LBP), Dr. Rodrigo aponta que em um estudo publicado no The Spine Journal, os resultados a longo prazo de todos os estudos controlados randomizados, demonstraram que a cirurgia de fusão não é melhor do que o tratamento não-operatório na melhora da dor e da incapacidade em lombalgia crônica. “As diretrizes atuais defendem o uso de programas multidisciplinares de reabilitação cognitiva-comporhttp://randradefisio.com.br/fisioterapeuta-rodrigo-andrade/tamental e exercícios como tratamentos de primeira opção para lombalgia crônica, com a cirurgia de fusão sendo considerada apenas se tais tratamento conservadores estiverem indisponíveis ou não conseguirem melhorar a condição dos pacientes. A literatura atual não indica a cirurgia de fusão da coluna lombar antes de realizar um tratamento fisioterapêutico, por meio de exercícios baseados em evidências científicas. ” Para Dra. Ines “num mundo cada vez mais estático e de estilo de vida sedentário, o movimento é a solução”.
Carta ao Fantástico
Considerando a preocupação de profissionais fisioterapeutas em relação ao conteúdo veiculado no programa, nesta quarta-feira (13), o Crefito-3 enviou uma carta à produção do Fantástico com alertas sobre a reportagem veiculada. No documento, o Crefito-3 reverberou a preocupação de fisioterapeutas especialistas, alertou para vários equívocos, solicitou imediata reparação e colocou-se à disposição da emissora. Instigado pela repercussão calorosa nas redes sociais, o fisioterapeuta Dr. Rogério Liporaci decidiu reexibir em sua página no Facebook, uma aula-minuto relacionada ao efeito da corrida na estrutura do disco invertebral, que havia sido produzida semanas antes da reportagem. “Quando vi a repercussão nas redes sociais a respeito da matéria exibida pelo programa e depois que tive a oportunidade de assisti-la, achei interessante ao invés de atacar, o que não é cabível, reexibir esta aula-minuto e, concomitante, redigir uma breve “carta” ao Dr. Drauzio (e assim à toda a equipe de pauta do programa), onde o convido a conhecer um pouco de nossa atuação junto às desordens de coluna e, aproveitando o ensejo, para conclamar todos nossos parceiros médicos a sempre confiarem em nós como parte da solução, que nos permitam sempre participar deste debate, expondo nosso arsenal de atuação que pode ser utilizado em conjunto com o que foi apresentado na reportagem, e não excluindo o que foi debatido pelos profissionais”. Dr. Rogério acrescenta que “a motivação ímpar era transformar um evento que teve repercussão negativa entre nossos colegas de profissão, talvez pela ansiedade em sermos vistos como parte mais integrante da conduta proposta nos casos exibidos, em num momento de exaltar e exibir à toda população a competência e embasamento científico da nossa prática clínica. Vamos aproveitar a oportunidade para nos apresentarmos como uma profissão competente e que, juntamente com classe médica, conseguimos realizar um trabalho excelente para estas desordens”.
Fonte:
http://www.crefito3.org.br/dsn/noticias.asp?codnot=2835